Memórias Póstumas de Brás Cubas, Machado de Assis, 3ª edição, São Paulo-SP: Martin Claret, 2012, 195 páginas.
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Não é incomum um leitor ficar de cara feia ao se deparar com um clássico da nossa literatura. Por uma série de motivos ficamos com receio dessa leitura, seja por medo de uma escrita arcaica ou até por se tratar de histórias narradas em outros tempos, com outro tipo de cenário, fora da nossa realidade. Mas é inegável o fato de que uma obra escrita postumamente por um personagem atrai olhares curiosos.

A ideia de um personagem escrever sua história de vida postumamente só poderia surgir de um grande gênio das letras. Até hoje, mesmo após um século de sua morte, Machado de Assis é lembrado e reverenciado como o maior escritor da nossa língua. Sendo importante em duas escolas literárias distintas, o escritor é também o responsável por trazer o realismo para o Brasil, justamente com Memórias Póstumas de Brás Cubas.

Como já dá para imaginar, o livro se inicia com a morte de Brás Cubas, o nosso narrador-personagem. A intenção do personagem é narrar suas memórias sem os cuidados que seriam necessários caso ainda estivesse em vida, ou seja, ele pode ser crítico e irônico sem que nada e nem ninguém seja contra suas palavras. Com um estilo único de narrativa, Brás Cubas se torna amigo do leitor para comentar sobre seus relacionamentos com as mulheres, a política e principalmente a importância da vida e da morte. Começando, claro, por sua morte.

“Creia-me, o menos mau é recordar; ninguém se fie da felicidade presente; há nela uma gota de baba de Caim. Corrido o tempo e cessado o espasmo, então sim, então talvez se pode gozar de deveras, porque entre uma e outra dessas duas ilusões, melhor é a que se gosta sem doer” (pág. 29).

Ao comentar sobre sua própria obra, Brás Cubas diz que ao escrever suas memórias só pode incluir “as substâncias da vida”. Dá para supor, portanto, que é uma obra sem qualquer tipo de enrolação e uma história no mínimo agradável. Realmente Memórias Póstumas de Brás Cubas tem uma história agradável, mas em um primeiro momento possui uma narrativa lenta.

No início é difícil compreender o motivo que levou o autor a estruturar sua obra de uma forma que a ideia caminhe por várias direções antes de chegar a uma conclusão. Isso torna a leitura mais lenta, e a união com a linguagem antiga pode desagradar alguns leitores. Posteriormente o próprio Brás explica seu estilo, por isso é bom continuar dando uma chance ao livro, já que a história que vem com o passar dos capítulos vale a pena ser lida.

Como a obra foi publicada em folhetins, os capítulos são curtos (alguns exageradamente curtos) e mostram desde o início o estilo único de narrativa de criador e criatura. Brás Cubas é um personagem de características extremamente trabalhadas. Seu tom irônico só poderia ter sido criado com excelência por Machado, e graças a ele que encaramos com um sorriso no rosto as dúvidas de Brás e a maneira com que ele se relaciona com o leitor, seja com suas filosofias ou o deboche, na maioria das vezes subestimando a capacidade do leitor.

Por representar a alta sociedade da época, Brás Cubas vive uma intensa relação com tudo o que a envolve. Desde a política, até questões relacionadas ao casamento, fazem parte da obra, que pode ser considerada uma crítica para a então burguesia e as pessoas que faziam parte desse grupo de pessoas. É interessante, por exemplo, notar que um político tinha necessidade de ter uma mulher ao seu lado, o que claro não dará certo no sentido de diferentes pessoas lutarem por seus respectivos interesses.

A crítica existente em Memórias Póstumas de Brás Cubas também tem uma qualidade marcante: dar a possibilidade de a filosofia ser explorada nos mais variados aspectos. Nisso conhecemos Quincas Borba, outro personagem importante de Machado de Assis e que posteriormente, em 1891, ganharia um livro próprio. Quincas é o responsável por apresentar a Brás Cubas e ao leitor a chamada filosofia humanista, algo que pode ser complexo para alguns e desnecessário para outros. Algo que acontece muito em um livro em que o próprio narrador diz que existem capítulos inúteis ao longo de toda a história. Mas será que a vida de Brás Cubas foi inútil e fracassada? Essa pergunta só tem uma resposta após essa leitura, que possui altos e baixos, mas ainda assim é recomendada.

Por seu estilo realista até mesmo ao falar sobre a morte, o livro tem inúmeras passagens marcantes e com uma riqueza de detalhes que conquista o leitor, sendo que esse tem grandes chances de colocá-la no topo entre obras clássicas. Talvez ao escrever Memórias Póstumas de Brás Cubas, publicado originalmente em 1881, Machado de Assis não imaginou que sua obra atravessaria gerações e seria classificada como uma das melhores da nossa literatura. Não é exagero dizer que essa obra é um verdadeiro marco; uma obra inesquecível, mesmo não sendo perfeita.

“Longa foi a agonia, longa e cruel, de uma crueldade minuciosa, fria, repisada, que me encheu de dor e estupefação. Era a primeira vez que eu via morrer alguém. Conhecia a morte de oitiva; quando muito, tinha-a visto já petrificada no rosto de algum cadáver, que acompanhei ao cemitério, ou trazia-lhe a ideia embrulhada nas amplificações de retórica dos professores de coisas antigas – a morte aleivosa de César, a austera de Sócrates, a orgulhosa de Catão. Mas esse duelo do ser e do não ser, a morte em ação, dolorida, con-traída, convulsa, sem aparelho política ou filosófico, a morte de uma pessoa amada, essa foi a primeira vez que a pude encarar” (pág. 62).

Para adquirir seu exemplar de Memórias Póstumas de Brás Cubas, acesse o site da Livraria Saraiva clicando aqui.

8 Comentários

  1. Esse livro sim é considerado um clássico. Minha professora de português, anos atrás, estava querendo que todos alunos pegasse esse livro na biblioteca para ler. Mas como eu era rebelde, eu fui ler o livro A Cabana hahahahaha
    Ótima resenha amigo!


    Abraços,
    www.booksever.blogspot.com

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  2. Eu sei que apesar de muita gente virar a cara quando vê um clássico, eu tenho bastante simpatia por eles. Brás Cubas é fantástico e ainda de um dos meus escritores brasileiros favoritos. Vale muito a pena conferir.


    bjs,
    Camila Márcia
    @camila_marcia
    De Livro em Livro
    Devaneios Fugazes

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  3. meu Deus, que capa LIIINDA *-----------------* a capa do meu nem se compara com essa... tô quase comprando o livro de novo só por causa da capa rsrsrs

    é meu livro preferido de Machado, um clássico maravilhoso...

    http://torporniilista.blogspot.com.br/

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  4. Passei aqui especialmente para informar que seu blog está entre os "Blogs do Mês" de Julho do DSA!
    Para saber mais sobre o quadro, acesse a postagem de hoje (02/08/2013) do DSA.
    Agradeço por todo o carinho, espero lhe encontrar no próximo mês também!

    Beijinhos Alados ♥

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  5. Wow, ótima resenha.


    Lí o livro há um tempo, na época do vestibular e gostei, achei bem interessante e inovador. Como você disse, no início a narrativa é bem lenta e isso me incomodou, mas como já havia iniciado a leitura e parado pelo mesmo motivo resolvi continuar.
    Sem dúvidas é um ótimo clássico, e o deboche de Brás diminuindo o leitor é um verdadeiro tapa na cara, é como se ele desafiasse o leitor a continuar a leitura para que não seja considerado tudo aquilo que ele diz que é.
    Muito bom!

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  6. Lucas Souza/Descobrindo Livros2 de agosto de 2013 às 22:17

    Olá, Ricardo.
    Ótima resenha, você destacou todos os pontos positivos e os que podem vir a desanimar um leitor a ler tal obra. Pra ser sincero, eu parei na metade, só lerei de novo quando for necessário. A narrativa, a linguagem arcaica, tudo me irritou rsrs só quando for época de vestibular eu lerei novamente.
    Abraços
    Descobrindolivros.blogspot.com.br

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  7. Há alguns anos eu comecei a ler, mas não lembro por qual motivo eu parei. Porém, eu vi o filme e achei a história genial, embora eu saiba que o filme não foi fiel ao livro e não mostre, detalhadamente, a visão de Brás sobre a vida e as pessoas. Mas o que eu realmente queria ler era a história de Quincas Borba.

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  8. Amanda, o livro é tão bom quanto o filme e acho que posso dizer ser um dos poucos casos em que a adaptação não ficou ruim. Não tem uma riqueza de detalhes, mas a essência está ali presente.
    Farei uma resenha sobre o filme na terça-feira. Espero que goste :D
    Obrigado por seu comentário.

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